Tranquilo como o céu e mais rápido que um relâmpago
Criar hábitos produtivos nos deixa mais calmos, precisos e bem-sucedidos. Essa é mais uma lição ensinada pelo Dragon Ball.
Quando subiu ao Templo Sagrado de Kami-Sama pela primeira vez, Goku recebeu treinamento cujo foco era “somente movimentos necessários”. O objetivo era lutar com máxima eficiência gastando o mínimo de energia. Aplicado à nossa vida, significa aumentar a produtividade pessoal e profissional.
“Tranquilo como o céu e mais rápido que um relâmpago”
Como conseguir esse aparente paradoxo? De que jeito seria mais rápido que um relâmpago sem precisar de um impulso enérgico que é nada tranquilo como o céu? Como ser produtivo sem fazer força?
O segredo é criar os hábitos certos por meio da prática contínua.
O não esforço é, na verdade, o resultado de muito esforço.
Assim, o menino macaco treinou por 3 anos, a tal ponto que não precisaria pensar para agir durante as batalhas. Os golpes fluiriam com naturalidade, mesmo em situações adversas, afinal o treinamento também inclui imprevistos e momentos de estresse.
Não agiria mais baseado na emoção, tampouco no pensamento impulsivo, mas na repetição de hábitos cuidadosamente criados e aperfeiçoados. Desse modo, lutaria “somente com movimentos necessários”, sendo “tranquilo como o céu e mais rápido que um relâmpago”.
Por não precisar tomar grandes decisões nos conflitos, ganharia velocidade, força e precisão em relação aos oponentes.
Podemos aprender com Kami-Sama sem subir ao templo. Basta entendermos o básico do funcionamento do nosso cérebro para sermos calmos como o céu e mais rápidos que um relâmpago, ou seja, mais produtivos.
Como funcionam os hábitos?
Quando repetimos com frequência determinada ação, nosso cérebro a assimila e a executa automaticamente, isto é, sem pensar. É o que conhecemos como hábito. Todo hábito depende de 3 fatores:
1 deixa;
2 rotina;2. rotina;
3. recompensa.
Esse loop do hábito se move graças ao anseio, ou seja, o impulso que faz a gente iniciar o ciclo de deixa, rotina e recompensa.
Isso ocorre porque o cérebro, após se acostumar com determinado hábito, passa a antecipar o prazer decorrente daquela ação. Por exemplo, ao pensar em tomar um suco, o que nos leva a comprar ou preparar um copo é o anseio, ou seja, o prazer antecipado que sentimos logo após ~pensar~ na bebida.
O desejo pode ser pela sensação de refresco, a degustação do sabor, a satisfação por ser saudável, etc.
A deixa pode ser um pensamento, a sede, o contato visual com uma fruta ou embalagem, o ato de pegar um prato de comida, etc.
Seguimos, então, a rotina (comprar, preparar ou servir o suco), que traz a recompensa: sentir a sensação desencadeada por beber o suco, isto é, aquela em que o cérebro antecipou na deixa e nos deixou ansiosos.
O mesmo ocorre ao dirigirmos, pedalarmos ou pilotarmos: você pensa em cada marcha trocada, aperto no freio e seta sinalizada, ou faz tudo automaticamente?
No caso do Goku, as deixas são os movimentos dos inimigos, a rotina são os golpes e a recompensa, a vitória. O anseio do menino macaco é combater o mal. A rotina de treinamento é o que vai transformar as técnicas do Goku em hábitos invencíveis.
Ao entender o básico do funcionamento dos hábitos, percebemos que nosso dia a dia é a soma de pequenos hábitos. Uns saudáveis, outros destrutivos. Uns quase imperceptíveis, outros explícitos. Pense em alguns dos seus por um momento.
A procrastinação como hábito
A grande vantagem biológica de funcionar à base de hábitos é que nosso cérebro poupa esforço. E economizar energia é uma das prioridades do cérebro, já que em um adulto típico, ele gasta:
- 20% do oxigênio respirado é consumido pelo o cérebro.
- 2% do peso total do corpo corresponde ao cérebro.
- 12 watts (dá para acender uma lâmpada!) é a potência média do cérebro.
Talvez seja por isto que muitos de nós detestam sair da zona de conforto: exige-se mais esforço que o normal.
Estudos indicam que nossa mente reproduz sensações equivalentes a dor física quando precisa sair da zona de conforto. Isso, inclusive, explica porque tendemos a procrastinar em todas as áreas da vida (não só no trabalho).
O que chamamos de zona de conforto varia de acordo com a pessoa. Afinal, cada um tem os próprios hábitos, portanto não há padrão. Sendo assim, pode ser desconfortável estudar temas novos e complexos, assumir projetos diferentes no trabalho, falar com pessoas desconhecidas, etc.
De volta à procrastinação, o adiamento de tarefas alivia o mal-estar causado pela mente ao ter que fazer esforço. A enrolação também funciona como um hábito, afinal depende do desejo (ou anseio) de escapar do presente, engatilhado pela deixa (tarefa desconfortável), seguido da rotina (enrolar) e da recompensa (fuga do desconforto imediato).
Por acaso você… Já abriu o Facebook em vez executar uma tarefa chata no trabalho? Desviou a atenção em vez de telefonar para aquela pessoa que conhece pouco? Preferiu assistir à TV em vez de estudar?
Agora reflita sobre quais as deixas, rotinas e recompensas você obteve com essas ações. O anseio nós já sabemos: sentir alívio.
A solução para agir “somente com os movimentos necessários”, leia-se agir com fluidez, tranquilidade e sem enrolação é criar hábitos saudáveis e mudar os ruins. E o primeiro passo você já deu: entender o básico sobre o mecanismo dos hábitos na nossa cabeça.
Criando os hábitos certos como o Goku
É importante compreender — e aceitar — que nossa mente interpreta a realidade do jeito que ela quer. Por isso simula sensações de dor física quando julga uma tarefa chata e nos induz a procrastinar em busca do prazer imediato.
O remédio aqui é observar esse padrão de comportamento e ignorá-lo seguindo em frente no seu propósito inicial. O desconforto simplesmente passa e, eventualmente, gera uma recompensa.
Por isso o Goku, durante o treinamento com o Kami-Sama, aprendeu a meditar, controlar a respiração e a conter os impulsos. São todas técnicas, cientificamente testadas, para acalmar a mente, criar hábitos produtivos e mudar os negativos.
Ferramentas e atitudes de produtividade
Métodos para gestão de tempo, como o Pomodoro, que consiste em focar-se durante 25 minutos e relaxar por 5, ajudam a aumentar a produtividade. Uma das lógicas por trás da eficiência dessa técnica é o desvio da sua atenção da tarefa para o tempo.
Essa pequena mudança de foco enfraquece a deixa da tarefa (tédio/desafio) porque agora os holofotes do cérebro estão no tempo, não na atividade. Então a deixa passa a ser o relógio, o desejo, cumprir o tempo, e a recompensa, os 5 minutos de descanso ao final. A rotina é a realização da tarefa.
E cá para nós, é mais tranquilo encarar blocos de 25 minutos de trabalho do que bater de frente com aquele problemão, né? Nós meio que enganamos nosso cérebro tirando de cena a deixa que o levaria a se sentir mal.
Criar listas é ótimo porque elas ajudam a visualizar e organizar os afazeres de qualquer área da nossa vida. Listas também servem para criar hábitos, pois ao ver a lista, temos uma deixa (a tarefa), a rotina (agir) e a recompensa (conclusão). Um anseio válido seria ver a lista toda riscada!
Novamente, a deixa do velho hábito de procrastinação ficou esquecida.
Depois de um tempo, a gente se acostuma e acaba resolvendo os problemas com mais tranquilidade, ainda que sejam difíceis e nos façam queimar alguns neurônios.
Aí, quando assustamos, já criamos um hábito e alteramos um velho.
Assim, mesmo quando precisar de fazer mais esforço que o normal, seu cérebro não o incomodará tanto. Aliás, será seu aliado, funcionando movido a bons hábitos, quase sem pensar.
Aliás, é a prática constante, cheia de imprevistos e estresses, que nos dá experiência. Eis porque o não esforço só vem depois de muito esforço. É o que diferencia os novatos dos mestres.
Alimentando hábitos e se aperfeiçoando sempre
O fato de agir sem pensar é muito valorizado pela sabedoria oriental. Mestres de artes marciais ressaltam a importância da mente vazia durante a realização de seus exercícios. Por isso o Kami-Sama treinou tanto o Goku para criar hábitos e lutar sem precisar tomar grandes decisões no campo de batalha.
Note que agir sem pensar, nesse sentido, não significa agir inconsequentemente. Significa estar tão bem treinado em algo que seu cérebro não precisa tomar decisões enquanto faz.
Um bom profissional não tem que ficar pensando em cada passo da tarefa. Ele simplesmente faz. A ação flui, mesmo quando há algum imprevisto. Porque o hábito já está enraizado na mente dele.
Todo esse processo é difícil, mas vale a pena. Afinal já é difícil de qualquer jeito, ou você acha que viver com a procrastinação é fácil?
A diferença é que a dificuldade de criar, praticar e enraizar um hábito, a ponto de agir com a mente vazia, se transforma em facilidade de agir na hora certa.
A dificuldade típica de fazermos as coisas sem controle da nossa mente só traz mais obstáculos ao longo do tempo. Então continue refinando seus hábitos e observando como funciona sua mente.
Assim como o Goku, não pare de treinar depois de descer do templo. Continue buscando mais e mais. O aperfeiçoamento, inclusive, pode se tornar um hábito!
E ah, assista pelo menos a um pedaço do episódio que introduz toda essa filosofia abordada no texto. Vale a pena pelo aprendizado e pela nostalgia.
Imagens:
Templo Sagrado de Kamisama, Goku vs Boneco, Loops de hábito (editadas por mim), Procrastinação , Relógio , Goku treinando.